Psicóloga, doutora em Educação, explica como a escola e a família podem atuar para
garantir o direito à Educação de alunos com distúrbios de aprendizagem ou de comportamento
Betânia Dell'Agli: A criança com TDAH pode aprender. É preciso saber como
ajudá-la Psicóloga, doutora em Educação, explica como a escola e a família
podem atuar para garantir o direito à Educação de alunos com distúrbios de
aprendizagem ou de comportamento
Betânia Dell Agli. Foto: Arquivo pessoal
Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) evidencia que, em três anos,
o consumo de metilfanidato, princípio
ativode remédios como Ritalina,
Concerta e Ritalina LA, teve um aumento de 73,5%
entre crianças e jovens de 6 a 16 anos.
Os números chamam a atenção para um
crescimento excessivo nos diagnósticos de
Transtorno de Déficit de Atenção
com ou sem Hiperatividade (TDAH) e na prática de tratar
questões comportamentais exclusivamente com remédios.
O tema foi discutido na edição de junho/julho da NOVA ESCOLA,
que está nas bancas, e é tratado há seis anos pelo Centro Criança Casulo,
coordenado pela psicóloga e doutora
em Educação Betânia Alves Veiga Dell Agli, em São João da Boa Vista,
a 215 quilômetrosde São Paulo. Nesta entrevista, ela fala sobre
os problemas nodiagnóstico de TDAH e sobre o papel da escola, dos pais e do
professor no desenvolvimento da criança que
, realmente, possui os distúrbios.
Os dados da Anvisa chamam a atenção para um exagero nos diagnósticos
de TDAH. A o que se deve esse aumento?
BETÂNIA ALVES VEIGA DELL AGLI O debate sobre a medicalização tem
sido conduzido de forma restrita e preconceituosa, o que não ajuda no
desenvolvimento da criança. É importante entender quem faz os diagnósticos
de TDAH. Vejo muitas pessoas que são avaliadas em apenas uma consulta
médica ou, quando muito, são analisadas por meio de escalas que abordam
os sintomas do transtorno. O diagnóstico não deve ser pautado em condutas
parciais, considerando apenas a questão biológica. Ele deve ser realizado por
uma equipe interdisciplinar capacitada e precisa incluir informações passadas
pelo professor e pela família e uma análise do contexto no qual a criança está
inserida. Além dos problemas apontados, há dois aspectos que devem ser
considerados ao analisar o aumento no diagnóstico de TDAH: o maior
esclarecimento sobre o transtorno e o acesso obrigatório à escola. Antes,
as crianças com problemas de comportamento e baixo desempenho evadiam
. Hoje, é preciso lidar com a questão de outra forma.
Se o professor é o primeiro a perceber que o estudante apresenta
uma condição de aprendizagem diferente dos demais, o que ele deve fazer?
BETÂNIA Acredito que o educador deva começar fazendo tentativas
pedagógicas, utilizando diferentes recursos para ajudar o aluno. Caso
perceba que as dificuldades permanecem, aí é hora de encaminhá-lo
para uma avaliação neuropsicológica. Essa análise pode evidenciar
melhor as dificuldades e também as habilidades da criança, possibilitando
direcionar as intervenções. Sabemos, no entanto, o quanto esse diagnóstic
o completo é difícil no país. Atualmente, não contamos com muitos
profissionais que desenvolvam esse trabalho, ainda mais no setor público.
E o uso de medicação?
BETÂNIA O remédio tem de ser encarado como um dos aspectos do
tratamento do TDAH, não como a solução geral. Para que ele seja ministrado
, é preciso que uma equipe de profissionais competentes no assunto conclua,
ao considerar diversas informações, que a medida trará benefícios ao
desenvolvimento integral da criança. De maneira alguma o medicamento
exclui condutas interventivas no âmbito educacional.
Sabemos que há muitos diagnósticos equivocados, mas como trabalhar
com alunos que, de fato, têm o problema?
BETÂNIA O primeiro ponto importante é o professor conhecer o transtorno
. Em seguida, é preciso pensar sobre as características desse aluno específico
que tem TDAH: como ele reage às frustrações, como lida com as tarefas
escolares, qual o momento de maior agitação, como cuida de seus materiais etc.
É importante que o docente entenda que os comportamentos apresentados
pela criança não são propositais ou "por querer". Ela não consegue agir de
outra forma, e cabe à escola planejar como auxiliá-la. Pensar o melhor local
da sala de aula para o aluno se sentar - considerando que se distrai com qualquer
estímulo irrelevante -, monitorar as tarefas, tocar nele com o objetivo de chamar
a sua atenção para aspectos importantes em momentos específicos e diminuir
os estímulos quando possível são algumas ações importantes. Tudo deve ser
feito com o conhecimento da criança.
Como deve ser o diálogo com o aluno?
BETÂNIA É fundamental que a comunicação seja adequada. O uso de uma
linguagem descritiva é de suma importância, principalmente quando o aluno
apresenta comportamento opositor desafiante, comum no quadro de TDAH.
Além disso, o professor deve reservar momentos para se sentar com a criança
, fazer uma avaliação do comportamento dela durante a semana e estabelecer metas
para a próxima. O elogio descritivo também é fundamental porque mostra ao alun
o as conquistas dele, além de propiciar o engajamento.
Qual deve ser a postura da coordenação e da direção da escola quando
recebem um aluno diagnosticado com TDAH?
BETÂNIA A escola como um todo deve propiciar o estudo e a reflexão sobre
o tema. Cabe aos gestores pensar junto com o professor as melhores intervenções,
estabelecer metas e, ao longo do processo, fazer avaliações das ações e pensar em
alternativas para o que não deu certo. Acredito que passar segurança ao docente,
caminhar junto com ele, é fundamental. A grande maioria dos professores quer
fazer o melhor para a criança, mas muitas vezes não sabe como.
Como estabelecer uma parceria entre pais e professores com o intuito
de beneficiar esse aluno com TDAH?
BETÂNIA A participação da família também é indispensável, pois as mesmas
condutas adotadas na escola devem ser colocadas em prática em casa:
o estabelecimento de horário para estudo, o monitoramento da organização
do material escolar, a escolha do melhor momento para a criança fazer as tarefas.
É necessário criar uma parceria que, de fato, funcione, deixando de lado as
acusações de que os pais não educam bem, não colocam limites etc.
No meu entender,isso significa cada um fazer o que lhe compete,
tendo como objetivo comum o desenvolvimento do aluno.
Muitos professores decidem dar uma carga menor de tarefas a alunos
com transtornos de comportamento. Essa é uma boa estratégia?
BETÂNIA Diminuir as tarefas pouco vai ajudar o estudante. As atividades
precisam ser pensadas de acordo com as habilidades e dificuldades
que cada um apresenta. A criança com TDAH, como as demais,
pode aprender. A questão é o que o professor fará para ajudá-la.
Pode ser preciso organizar as atividades de forma diferente.
Um exemplo: pensemos numa atividade de Matemática com 10 questões
. Talvez, para a criança com TDAH, seja necessário dividir a tarefa
em pequenos blocos, em que ela possa fazer quatro exercícios e descansar
, depois três e, após algum tempo, o restante. Essas pequenas metas
dão à criança a sensação de que ela vai dar conta da atividade.
Se tiver de pensar em realizar todas as questões de uma vez só,
poderá desistir, pois tem dificuldade com o esforço menta
l continuado. Isso não é dar menos, mas compreender o aluno.
E o que fazer ao perceber que a criança apresenta alguma defasagem
em relação à turma?
BETÂNIA Algumas crianças com TDAH têm dificuldades de aprendizagem
e estão aquém dos colegas de turma. Nessa situação, o respeito não é ensinar
menos, mas pensar em atividades compatíveis com o nível do aluno.
Em alguns conteúdos, será preciso fazer adaptações, partindo do ponto
em que a criança está em termos de aquisição do conhecimento.
Será difícil o estudante compreender um texto se ele está no início do
processo de alfabetização, mesmo cursando o 4º ano do
Ensino Fundamental, por exemplo.
Fonte da Informação
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